Magna Concursos

Foram encontradas 50 questões.

3194994 Ano: 2023
Disciplina: Português
Banca: Consulplan
Orgão: Câm. Santos Dumont-MG
Provas:

A luta contra as palavras

De uns tempos para cá, nossa sensibilidade linguística parece ter-se exacerbado. Antes, havia palavras proferidas com o intuito de ofender, os chamados palavrões. Bons tempos! As coisas eram mais claras, pois todos sabíamos quais eram os termos, de fato, insultuosos. Hoje, a qualquer momento, podemos ser pilhados em flagrante delito linguístico ao usar corriqueiramente alguma palavra cujo teor preconceituoso, recém-desvelado por algum perscrutador de ignomínias, nos tenha escapado.

O Tribunal Superior Eleitoral, por exemplo, deu-nos a conhecer uma lista de termos e expressões considerados racistas pela Comissão de Igualdade Racial, entre os quais aparece o verbo “esclarecer”. Segundo os autores do texto, o racismo estaria embutido no termo por ele sugerir que “a compreensão de algo só pode ocorrer sob as bênçãos da claridade, da branquitude, mantendo no campo da dúvida e do desconhecimento as coisas negras”.

Se assim for, expressões como “deixar claro” ou “é claro que”, de largo uso, padecem do mesmo vício de origem. A sugestão dos signatários do documento é “o uso das palavras ‘explicar’ ou ‘elucidar’, por exemplo” em substituição a “esclarecer”. “Explicar”, na origem, é desdobrar, já que vem do latim “plico, as, are”, ou seja, “dobrar”, mas “elucidar” tem “lux” (“luz”) na raiz. Ora, se é racista a singela ideia de que a luz (ou a claridade) nos ajuda a enxergar melhor, o mesmo teria de valer para “elucidar”. Por algum motivo obscuro, porém, “elucidar” passou incólume pelo crivo da comissão.

Talvez, no entanto, a própria ideia de “enxergar” já contenha em si algum viés capacitista. Afinal, há pessoas que enxergam e pessoas que, embora não enxerguem, captam o universo à sua volta com riqueza de detalhes. Há quem diga que os deficientes visuais desenvolvam muito mais os outros sentidos, o que os faz perceber com grande acuidade coisas que independem da claridade, como sons, odores, temperaturas etc.

Segundo o dicionário Houaiss eletrônico, que constantemente recebe atualizações, o termo “cego”, quando usado no sentido de “deficiente visual”, pode ser ofensivo. Notemos que os lexicógrafos foram hesitantes, preferindo não tachar o termo, de uma vez por todas, de depreciativo. “Cego”, do latim “caecus, a, um”, quer dizer “escuro, negro, obscuro, espesso”. Para além do sentido estrito, já no latim o termo era usado no sentido figurado. Da expressão “caecus cupiditate”, herdamos o usual “cego pela paixão”. É dessa mesma raiz que vem o termo “obcecado”, isto é, “cegado” – a palavra está associada ao espírito; é este que está no escuro, incapaz de fazer um julgamento lúcido da situação. De novo, estamos às voltas com as ideias de claridade e escuridão, ligadas naturalmente ao dia e à noite.

O adjetivo “cego”, no sentido metafórico, costuma descrever aquilo que não tem medida, que foge ao controle da razão (paixão cega, entusiasmo cego, ódio cego, submissão cega), não sendo nem bom nem mau em si. Um entusiasmo cego pode ser a atitude de quem acredita de fato no que faz, um ódio cego pode ser sede de vingança. Enfim, o termo pode ser empregado para enfatizar uma ideia. Foi assim, aliás, que o usou Milton Nascimento na canção “Fé Cega, Faca Amolada”, em que a fé é inabalável. Vale notar que a lâmina sem corte, ao contrário da “amolada”, também é chamada de “cega” – daí o jogo de palavras usado na letra da canção.

Um nó difícil de desatar é logo chamado de “nó cego” – talvez fruto da ideia de ser muitíssimo apertado, uma variação da noção de ênfase associada ao termo. O bonito da língua é essa maleabilidade, esse leque de associações que se constroem solidariamente entre os falantes sem que se possa saber ao certo quem inventou o quê. Quer mais? Com o acréscimo de um hífen, “nó-cego” passa a ser mais um dos muitos nomes da aguardente de cana.

A expressão “às cegas”, que quer dizer “às escuras” ou “tateando no escuro, sem ver”, é frequentemente usada pelos “sommeliers” em suas conhecidas “degustações às cegas”, ocasiões em que experimentam os vinhos sem ver os rótulos. Dessa forma, libertam-se das informações prévias que poderiam influenciar seu julgamento sobre a bebida, entregando-se voluntariamente à escuridão que faz aflorar o olfato e o paladar.

(...)

Em suma, a tarefa a que se entregam os purificadores da língua parece ser uma infinita corrida de obstáculos. Se, no entanto, for mesmo esse o caminho a seguir para tornar o mundo um lugar mais saudável, talvez possamos criar uma linguagem verdadeiramente neutra, construída com números e letras aleatórias, como as placas de automóvel, coisa que alguma sofisticada inteligência artificial poderia vir a elaborar.

Aos saudosistas restarão o Museu da Língua Portuguesa, que, aliás, já existe, e as bibliotecas que não tiverem perdido de vez o sentido. Hoje luta-se contra as palavras. Bons tempos aqueles em que o poeta lutava com as palavras.

(NICOLETI, Thaís. A Luta contra as palavras. Folha de S. Paulo, 2023. Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/blogs/thaisnicoleti/2023/01/a-luta-contra-as-palavras.shtml. Acesso em: 15/01/2023.)

Releia: “Hoje luta-se contra as palavras. Bons tempos aqueles em que o poeta lutava com as palavras.” (10º§). Tendo em vista as ideias veiculadas ao longo do texto, pode-se afirmar que “lutar com as palavras” e “lutar contra as palavras” configuram lutas com propósitos

 

Provas

Questão presente nas seguintes provas
3194993 Ano: 2023
Disciplina: Português
Banca: Consulplan
Orgão: Câm. Santos Dumont-MG
Provas:

A luta contra as palavras

De uns tempos para cá, nossa sensibilidade linguística parece ter-se exacerbado. Antes, havia palavras proferidas com o intuito de ofender, os chamados palavrões. Bons tempos! As coisas eram mais claras, pois todos sabíamos quais eram os termos, de fato, insultuosos. Hoje, a qualquer momento, podemos ser pilhados em flagrante delito linguístico ao usar corriqueiramente alguma palavra cujo teor preconceituoso, recém-desvelado por algum perscrutador de ignomínias, nos tenha escapado.

O Tribunal Superior Eleitoral, por exemplo, deu-nos a conhecer uma lista de termos e expressões considerados racistas pela Comissão de Igualdade Racial, entre os quais aparece o verbo “esclarecer”. Segundo os autores do texto, o racismo estaria embutido no termo por ele sugerir que “a compreensão de algo só pode ocorrer sob as bênçãos da claridade, da branquitude, mantendo no campo da dúvida e do desconhecimento as coisas negras”.

Se assim for, expressões como “deixar claro” ou “é claro que”, de largo uso, padecem do mesmo vício de origem. A sugestão dos signatários do documento é “o uso das palavras ‘explicar’ ou ‘elucidar’, por exemplo” em substituição a “esclarecer”. “Explicar”, na origem, é desdobrar, já que vem do latim “plico, as, are”, ou seja, “dobrar”, mas “elucidar” tem “lux” (“luz”) na raiz. Ora, se é racista a singela ideia de que a luz (ou a claridade) nos ajuda a enxergar melhor, o mesmo teria de valer para “elucidar”. Por algum motivo obscuro, porém, “elucidar” passou incólume pelo crivo da comissão.

Talvez, no entanto, a própria ideia de “enxergar” já contenha em si algum viés capacitista. Afinal, há pessoas que enxergam e pessoas que, embora não enxerguem, captam o universo à sua volta com riqueza de detalhes. Há quem diga que os deficientes visuais desenvolvam muito mais os outros sentidos, o que os faz perceber com grande acuidade coisas que independem da claridade, como sons, odores, temperaturas etc.

Segundo o dicionário Houaiss eletrônico, que constantemente recebe atualizações, o termo “cego”, quando usado no sentido de “deficiente visual”, pode ser ofensivo. Notemos que os lexicógrafos foram hesitantes, preferindo não tachar o termo, de uma vez por todas, de depreciativo. “Cego”, do latim “caecus, a, um”, quer dizer “escuro, negro, obscuro, espesso”. Para além do sentido estrito, já no latim o termo era usado no sentido figurado. Da expressão “caecus cupiditate”, herdamos o usual “cego pela paixão”. É dessa mesma raiz que vem o termo “obcecado”, isto é, “cegado” – a palavra está associada ao espírito; é este que está no escuro, incapaz de fazer um julgamento lúcido da situação. De novo, estamos às voltas com as ideias de claridade e escuridão, ligadas naturalmente ao dia e à noite.

O adjetivo “cego”, no sentido metafórico, costuma descrever aquilo que não tem medida, que foge ao controle da razão (paixão cega, entusiasmo cego, ódio cego, submissão cega), não sendo nem bom nem mau em si. Um entusiasmo cego pode ser a atitude de quem acredita de fato no que faz, um ódio cego pode ser sede de vingança. Enfim, o termo pode ser empregado para enfatizar uma ideia. Foi assim, aliás, que o usou Milton Nascimento na canção “Fé Cega, Faca Amolada”, em que a fé é inabalável. Vale notar que a lâmina sem corte, ao contrário da “amolada”, também é chamada de “cega” – daí o jogo de palavras usado na letra da canção.

Um nó difícil de desatar é logo chamado de “nó cego” – talvez fruto da ideia de ser muitíssimo apertado, uma variação da noção de ênfase associada ao termo. O bonito da língua é essa maleabilidade, esse leque de associações que se constroem solidariamente entre os falantes sem que se possa saber ao certo quem inventou o quê. Quer mais? Com o acréscimo de um hífen, “nó-cego” passa a ser mais um dos muitos nomes da aguardente de cana.

A expressão “às cegas”, que quer dizer “às escuras” ou “tateando no escuro, sem ver”, é frequentemente usada pelos “sommeliers” em suas conhecidas “degustações às cegas”, ocasiões em que experimentam os vinhos sem ver os rótulos. Dessa forma, libertam-se das informações prévias que poderiam influenciar seu julgamento sobre a bebida, entregando-se voluntariamente à escuridão que faz aflorar o olfato e o paladar.

(...)

Em suma, a tarefa a que se entregam os purificadores da língua parece ser uma infinita corrida de obstáculos. Se, no entanto, for mesmo esse o caminho a seguir para tornar o mundo um lugar mais saudável, talvez possamos criar uma linguagem verdadeiramente neutra, construída com números e letras aleatórias, como as placas de automóvel, coisa que alguma sofisticada inteligência artificial poderia vir a elaborar.

Aos saudosistas restarão o Museu da Língua Portuguesa, que, aliás, já existe, e as bibliotecas que não tiverem perdido de vez o sentido. Hoje luta-se contra as palavras. Bons tempos aqueles em que o poeta lutava com as palavras.

(NICOLETI, Thaís. A Luta contra as palavras. Folha de S. Paulo, 2023. Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/blogs/thaisnicoleti/2023/01/a-luta-contra-as-palavras.shtml. Acesso em: 15/01/2023.)

Em qual passagem do texto o pronome destacado teve seu referente corretamente indicado?

 

Provas

Questão presente nas seguintes provas
3194991 Ano: 2023
Disciplina: Português
Banca: Consulplan
Orgão: Câm. Santos Dumont-MG
Provas:

A luta contra as palavras

De uns tempos para cá, nossa sensibilidade linguística parece ter-se exacerbado. Antes, havia palavras proferidas com o intuito de ofender, os chamados palavrões. Bons tempos! As coisas eram mais claras, pois todos sabíamos quais eram os termos, de fato, insultuosos. Hoje, a qualquer momento, podemos ser pilhados em flagrante delito linguístico ao usar corriqueiramente alguma palavra cujo teor preconceituoso, recém-desvelado por algum perscrutador de ignomínias, nos tenha escapado.

O Tribunal Superior Eleitoral, por exemplo, deu-nos a conhecer uma lista de termos e expressões considerados racistas pela Comissão de Igualdade Racial, entre os quais aparece o verbo “esclarecer”. Segundo os autores do texto, o racismo estaria embutido no termo por ele sugerir que “a compreensão de algo só pode ocorrer sob as bênçãos da claridade, da branquitude, mantendo no campo da dúvida e do desconhecimento as coisas negras”.

Se assim for, expressões como “deixar claro” ou “é claro que”, de largo uso, padecem do mesmo vício de origem. A sugestão dos signatários do documento é “o uso das palavras ‘explicar’ ou ‘elucidar’, por exemplo” em substituição a “esclarecer”. “Explicar”, na origem, é desdobrar, já que vem do latim “plico, as, are”, ou seja, “dobrar”, mas “elucidar” tem “lux” (“luz”) na raiz. Ora, se é racista a singela ideia de que a luz (ou a claridade) nos ajuda a enxergar melhor, o mesmo teria de valer para “elucidar”. Por algum motivo obscuro, porém, “elucidar” passou incólume pelo crivo da comissão.

Talvez, no entanto, a própria ideia de “enxergar” já contenha em si algum viés capacitista. Afinal, há pessoas que enxergam e pessoas que, embora não enxerguem, captam o universo à sua volta com riqueza de detalhes. Há quem diga que os deficientes visuais desenvolvam muito mais os outros sentidos, o que os faz perceber com grande acuidade coisas que independem da claridade, como sons, odores, temperaturas etc.

Segundo o dicionário Houaiss eletrônico, que constantemente recebe atualizações, o termo “cego”, quando usado no sentido de “deficiente visual”, pode ser ofensivo. Notemos que os lexicógrafos foram hesitantes, preferindo não tachar o termo, de uma vez por todas, de depreciativo. “Cego”, do latim “caecus, a, um”, quer dizer “escuro, negro, obscuro, espesso”. Para além do sentido estrito, já no latim o termo era usado no sentido figurado. Da expressão “caecus cupiditate”, herdamos o usual “cego pela paixão”. É dessa mesma raiz que vem o termo “obcecado”, isto é, “cegado” – a palavra está associada ao espírito; é este que está no escuro, incapaz de fazer um julgamento lúcido da situação. De novo, estamos às voltas com as ideias de claridade e escuridão, ligadas naturalmente ao dia e à noite.

O adjetivo “cego”, no sentido metafórico, costuma descrever aquilo que não tem medida, que foge ao controle da razão (paixão cega, entusiasmo cego, ódio cego, submissão cega), não sendo nem bom nem mau em si. Um entusiasmo cego pode ser a atitude de quem acredita de fato no que faz, um ódio cego pode ser sede de vingança. Enfim, o termo pode ser empregado para enfatizar uma ideia. Foi assim, aliás, que o usou Milton Nascimento na canção “Fé Cega, Faca Amolada”, em que a fé é inabalável. Vale notar que a lâmina sem corte, ao contrário da “amolada”, também é chamada de “cega” – daí o jogo de palavras usado na letra da canção.

Um nó difícil de desatar é logo chamado de “nó cego” – talvez fruto da ideia de ser muitíssimo apertado, uma variação da noção de ênfase associada ao termo. O bonito da língua é essa maleabilidade, esse leque de associações que se constroem solidariamente entre os falantes sem que se possa saber ao certo quem inventou o quê. Quer mais? Com o acréscimo de um hífen, “nó-cego” passa a ser mais um dos muitos nomes da aguardente de cana.

A expressão “às cegas”, que quer dizer “às escuras” ou “tateando no escuro, sem ver”, é frequentemente usada pelos “sommeliers” em suas conhecidas “degustações às cegas”, ocasiões em que experimentam os vinhos sem ver os rótulos. Dessa forma, libertam-se das informações prévias que poderiam influenciar seu julgamento sobre a bebida, entregando-se voluntariamente à escuridão que faz aflorar o olfato e o paladar.

(...)

Em suma, a tarefa a que se entregam os purificadores da língua parece ser uma infinita corrida de obstáculos. Se, no entanto, for mesmo esse o caminho a seguir para tornar o mundo um lugar mais saudável, talvez possamos criar uma linguagem verdadeiramente neutra, construída com números e letras aleatórias, como as placas de automóvel, coisa que alguma sofisticada inteligência artificial poderia vir a elaborar.

Aos saudosistas restarão o Museu da Língua Portuguesa, que, aliás, já existe, e as bibliotecas que não tiverem perdido de vez o sentido. Hoje luta-se contra as palavras. Bons tempos aqueles em que o poeta lutava com as palavras.

(NICOLETI, Thaís. A Luta contra as palavras. Folha de S. Paulo, 2023. Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/blogs/thaisnicoleti/2023/01/a-luta-contra-as-palavras.shtml. Acesso em: 15/01/2023.)

Considerando os possíveis sentidos frequentemente atribuídos ao termo “cego/cega”, essa palavra só NÃO foi empregada em sua acepção exclusivamente conotativa na expressão

 

Provas

Questão presente nas seguintes provas
3194990 Ano: 2023
Disciplina: Português
Banca: Consulplan
Orgão: Câm. Santos Dumont-MG
Provas:

A luta contra as palavras

De uns tempos para cá, nossa sensibilidade linguística parece ter-se exacerbado. Antes, havia palavras proferidas com o intuito de ofender, os chamados palavrões. Bons tempos! As coisas eram mais claras, pois todos sabíamos quais eram os termos, de fato, insultuosos. Hoje, a qualquer momento, podemos ser pilhados em flagrante delito linguístico ao usar corriqueiramente alguma palavra cujo teor preconceituoso, recém-desvelado por algum perscrutador de ignomínias, nos tenha escapado.

O Tribunal Superior Eleitoral, por exemplo, deu-nos a conhecer uma lista de termos e expressões considerados racistas pela Comissão de Igualdade Racial, entre os quais aparece o verbo “esclarecer”. Segundo os autores do texto, o racismo estaria embutido no termo por ele sugerir que “a compreensão de algo só pode ocorrer sob as bênçãos da claridade, da branquitude, mantendo no campo da dúvida e do desconhecimento as coisas negras”.

Se assim for, expressões como “deixar claro” ou “é claro que”, de largo uso, padecem do mesmo vício de origem. A sugestão dos signatários do documento é “o uso das palavras ‘explicar’ ou ‘elucidar’, por exemplo” em substituição a “esclarecer”. “Explicar”, na origem, é desdobrar, já que vem do latim “plico, as, are”, ou seja, “dobrar”, mas “elucidar” tem “lux” (“luz”) na raiz. Ora, se é racista a singela ideia de que a luz (ou a claridade) nos ajuda a enxergar melhor, o mesmo teria de valer para “elucidar”. Por algum motivo obscuro, porém, “elucidar” passou incólume pelo crivo da comissão.

Talvez, no entanto, a própria ideia de “enxergar” já contenha em si algum viés capacitista. Afinal, há pessoas que enxergam e pessoas que, embora não enxerguem, captam o universo à sua volta com riqueza de detalhes. Há quem diga que os deficientes visuais desenvolvam muito mais os outros sentidos, o que os faz perceber com grande acuidade coisas que independem da claridade, como sons, odores, temperaturas etc.

Segundo o dicionário Houaiss eletrônico, que constantemente recebe atualizações, o termo “cego”, quando usado no sentido de “deficiente visual”, pode ser ofensivo. Notemos que os lexicógrafos foram hesitantes, preferindo não tachar o termo, de uma vez por todas, de depreciativo. “Cego”, do latim “caecus, a, um”, quer dizer “escuro, negro, obscuro, espesso”. Para além do sentido estrito, já no latim o termo era usado no sentido figurado. Da expressão “caecus cupiditate”, herdamos o usual “cego pela paixão”. É dessa mesma raiz que vem o termo “obcecado”, isto é, “cegado” – a palavra está associada ao espírito; é este que está no escuro, incapaz de fazer um julgamento lúcido da situação. De novo, estamos às voltas com as ideias de claridade e escuridão, ligadas naturalmente ao dia e à noite.

O adjetivo “cego”, no sentido metafórico, costuma descrever aquilo que não tem medida, que foge ao controle da razão (paixão cega, entusiasmo cego, ódio cego, submissão cega), não sendo nem bom nem mau em si. Um entusiasmo cego pode ser a atitude de quem acredita de fato no que faz, um ódio cego pode ser sede de vingança. Enfim, o termo pode ser empregado para enfatizar uma ideia. Foi assim, aliás, que o usou Milton Nascimento na canção “Fé Cega, Faca Amolada”, em que a fé é inabalável. Vale notar que a lâmina sem corte, ao contrário da “amolada”, também é chamada de “cega” – daí o jogo de palavras usado na letra da canção.

Um nó difícil de desatar é logo chamado de “nó cego” – talvez fruto da ideia de ser muitíssimo apertado, uma variação da noção de ênfase associada ao termo. O bonito da língua é essa maleabilidade, esse leque de associações que se constroem solidariamente entre os falantes sem que se possa saber ao certo quem inventou o quê. Quer mais? Com o acréscimo de um hífen, “nó-cego” passa a ser mais um dos muitos nomes da aguardente de cana.

A expressão “às cegas”, que quer dizer “às escuras” ou “tateando no escuro, sem ver”, é frequentemente usada pelos “sommeliers” em suas conhecidas “degustações às cegas”, ocasiões em que experimentam os vinhos sem ver os rótulos. Dessa forma, libertam-se das informações prévias que poderiam influenciar seu julgamento sobre a bebida, entregando-se voluntariamente à escuridão que faz aflorar o olfato e o paladar.

(...)

Em suma, a tarefa a que se entregam os purificadores da língua parece ser uma infinita corrida de obstáculos. Se, no entanto, for mesmo esse o caminho a seguir para tornar o mundo um lugar mais saudável, talvez possamos criar uma linguagem verdadeiramente neutra, construída com números e letras aleatórias, como as placas de automóvel, coisa que alguma sofisticada inteligência artificial poderia vir a elaborar.

Aos saudosistas restarão o Museu da Língua Portuguesa, que, aliás, já existe, e as bibliotecas que não tiverem perdido de vez o sentido. Hoje luta-se contra as palavras. Bons tempos aqueles em que o poeta lutava com as palavras.

(NICOLETI, Thaís. A Luta contra as palavras. Folha de S. Paulo, 2023. Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/blogs/thaisnicoleti/2023/01/a-luta-contra-as-palavras.shtml. Acesso em: 15/01/2023.)

Na passagem “Dessa forma, libertam-se das informações prévias [...]” (8º§), a forma verbal destacada estabelece relação de concordância com o termo

 

Provas

Questão presente nas seguintes provas
3194989 Ano: 2023
Disciplina: Português
Banca: Consulplan
Orgão: Câm. Santos Dumont-MG
Provas:

A luta contra as palavras

De uns tempos para cá, nossa sensibilidade linguística parece ter-se exacerbado. Antes, havia palavras proferidas com o intuito de ofender, os chamados palavrões. Bons tempos! As coisas eram mais claras, pois todos sabíamos quais eram os termos, de fato, insultuosos. Hoje, a qualquer momento, podemos ser pilhados em flagrante delito linguístico ao usar corriqueiramente alguma palavra cujo teor preconceituoso, recém-desvelado por algum perscrutador de ignomínias, nos tenha escapado.

O Tribunal Superior Eleitoral, por exemplo, deu-nos a conhecer uma lista de termos e expressões considerados racistas pela Comissão de Igualdade Racial, entre os quais aparece o verbo “esclarecer”. Segundo os autores do texto, o racismo estaria embutido no termo por ele sugerir que “a compreensão de algo só pode ocorrer sob as bênçãos da claridade, da branquitude, mantendo no campo da dúvida e do desconhecimento as coisas negras”.

Se assim for, expressões como “deixar claro” ou “é claro que”, de largo uso, padecem do mesmo vício de origem. A sugestão dos signatários do documento é “o uso das palavras ‘explicar’ ou ‘elucidar’, por exemplo” em substituição a “esclarecer”. “Explicar”, na origem, é desdobrar, já que vem do latim “plico, as, are”, ou seja, “dobrar”, mas “elucidar” tem “lux” (“luz”) na raiz. Ora, se é racista a singela ideia de que a luz (ou a claridade) nos ajuda a enxergar melhor, o mesmo teria de valer para “elucidar”. Por algum motivo obscuro, porém, “elucidar” passou incólume pelo crivo da comissão.

Talvez, no entanto, a própria ideia de “enxergar” já contenha em si algum viés capacitista. Afinal, há pessoas que enxergam e pessoas que, embora não enxerguem, captam o universo à sua volta com riqueza de detalhes. Há quem diga que os deficientes visuais desenvolvam muito mais os outros sentidos, o que os faz perceber com grande acuidade coisas que independem da claridade, como sons, odores, temperaturas etc.

Segundo o dicionário Houaiss eletrônico, que constantemente recebe atualizações, o termo “cego”, quando usado no sentido de “deficiente visual”, pode ser ofensivo. Notemos que os lexicógrafos foram hesitantes, preferindo não tachar o termo, de uma vez por todas, de depreciativo. “Cego”, do latim “caecus, a, um”, quer dizer “escuro, negro, obscuro, espesso”. Para além do sentido estrito, já no latim o termo era usado no sentido figurado. Da expressão “caecus cupiditate”, herdamos o usual “cego pela paixão”. É dessa mesma raiz que vem o termo “obcecado”, isto é, “cegado” – a palavra está associada ao espírito; é este que está no escuro, incapaz de fazer um julgamento lúcido da situação. De novo, estamos às voltas com as ideias de claridade e escuridão, ligadas naturalmente ao dia e à noite.

O adjetivo “cego”, no sentido metafórico, costuma descrever aquilo que não tem medida, que foge ao controle da razão (paixão cega, entusiasmo cego, ódio cego, submissão cega), não sendo nem bom nem mau em si. Um entusiasmo cego pode ser a atitude de quem acredita de fato no que faz, um ódio cego pode ser sede de vingança. Enfim, o termo pode ser empregado para enfatizar uma ideia. Foi assim, aliás, que o usou Milton Nascimento na canção “Fé Cega, Faca Amolada”, em que a fé é inabalável. Vale notar que a lâmina sem corte, ao contrário da “amolada”, também é chamada de “cega” – daí o jogo de palavras usado na letra da canção.

Um nó difícil de desatar é logo chamado de “nó cego” – talvez fruto da ideia de ser muitíssimo apertado, uma variação da noção de ênfase associada ao termo. O bonito da língua é essa maleabilidade, esse leque de associações que se constroem solidariamente entre os falantes sem que se possa saber ao certo quem inventou o quê. Quer mais? Com o acréscimo de um hífen, “nó-cego” passa a ser mais um dos muitos nomes da aguardente de cana.

A expressão “às cegas”, que quer dizer “às escuras” ou “tateando no escuro, sem ver”, é frequentemente usada pelos “sommeliers” em suas conhecidas “degustações às cegas”, ocasiões em que experimentam os vinhos sem ver os rótulos. Dessa forma, libertam-se das informações prévias que poderiam influenciar seu julgamento sobre a bebida, entregando-se voluntariamente à escuridão que faz aflorar o olfato e o paladar.

(...)

Em suma, a tarefa a que se entregam os purificadores da língua parece ser uma infinita corrida de obstáculos. Se, no entanto, for mesmo esse o caminho a seguir para tornar o mundo um lugar mais saudável, talvez possamos criar uma linguagem verdadeiramente neutra, construída com números e letras aleatórias, como as placas de automóvel, coisa que alguma sofisticada inteligência artificial poderia vir a elaborar.

Aos saudosistas restarão o Museu da Língua Portuguesa, que, aliás, já existe, e as bibliotecas que não tiverem perdido de vez o sentido. Hoje luta-se contra as palavras. Bons tempos aqueles em que o poeta lutava com as palavras.

(NICOLETI, Thaís. A Luta contra as palavras. Folha de S. Paulo, 2023. Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/blogs/thaisnicoleti/2023/01/a-luta-contra-as-palavras.shtml. Acesso em: 15/01/2023.)

Sobre o emprego do acento indicativo de crase, analise as assertivas a seguir.

I. Em “[...] captam o universo à sua volta.” (4º§), o acento grave é obrigatório para manter a correção gramatical.

II. Em “[...] entregando-se voluntariamente à escuridão [...]” (8º§), a supressão do acento grave modifica o sentido do enunciado.

III. Em “[...] em suas conhecidas ‘degustações às cegas’ [...]” (8º§), nesse contexto, emprego da crase é facultativo.

IV. Em “as ideias (...) ligadas naturalmente ao dia e à noite.” (5º§), “à noite” é uma expressão adverbial feminina de tempo, por isso, o emprego do acento grave é obrigatório.

Está correto o que se afirma apenas em

 

Provas

Questão presente nas seguintes provas
3194988 Ano: 2023
Disciplina: Português
Banca: Consulplan
Orgão: Câm. Santos Dumont-MG
Provas:

A luta contra as palavras

De uns tempos para cá, nossa sensibilidade linguística parece ter-se exacerbado. Antes, havia palavras proferidas com o intuito de ofender, os chamados palavrões. Bons tempos! As coisas eram mais claras, pois todos sabíamos quais eram os termos, de fato, insultuosos. Hoje, a qualquer momento, podemos ser pilhados em flagrante delito linguístico ao usar corriqueiramente alguma palavra cujo teor preconceituoso, recém-desvelado por algum perscrutador de ignomínias, nos tenha escapado.

O Tribunal Superior Eleitoral, por exemplo, deu-nos a conhecer uma lista de termos e expressões considerados racistas pela Comissão de Igualdade Racial, entre os quais aparece o verbo “esclarecer”. Segundo os autores do texto, o racismo estaria embutido no termo por ele sugerir que “a compreensão de algo só pode ocorrer sob as bênçãos da claridade, da branquitude, mantendo no campo da dúvida e do desconhecimento as coisas negras”.

Se assim for, expressões como “deixar claro” ou “é claro que”, de largo uso, padecem do mesmo vício de origem. A sugestão dos signatários do documento é “o uso das palavras ‘explicar’ ou ‘elucidar’, por exemplo” em substituição a “esclarecer”. “Explicar”, na origem, é desdobrar, já que vem do latim “plico, as, are”, ou seja, “dobrar”, mas “elucidar” tem “lux” (“luz”) na raiz. Ora, se é racista a singela ideia de que a luz (ou a claridade) nos ajuda a enxergar melhor, o mesmo teria de valer para “elucidar”. Por algum motivo obscuro, porém, “elucidar” passou incólume pelo crivo da comissão.

Talvez, no entanto, a própria ideia de “enxergar” já contenha em si algum viés capacitista. Afinal, há pessoas que enxergam e pessoas que, embora não enxerguem, captam o universo à sua volta com riqueza de detalhes. Há quem diga que os deficientes visuais desenvolvam muito mais os outros sentidos, o que os faz perceber com grande acuidade coisas que independem da claridade, como sons, odores, temperaturas etc.

Segundo o dicionário Houaiss eletrônico, que constantemente recebe atualizações, o termo “cego”, quando usado no sentido de “deficiente visual”, pode ser ofensivo. Notemos que os lexicógrafos foram hesitantes, preferindo não tachar o termo, de uma vez por todas, de depreciativo. “Cego”, do latim “caecus, a, um”, quer dizer “escuro, negro, obscuro, espesso”. Para além do sentido estrito, já no latim o termo era usado no sentido figurado. Da expressão “caecus cupiditate”, herdamos o usual “cego pela paixão”. É dessa mesma raiz que vem o termo “obcecado”, isto é, “cegado” – a palavra está associada ao espírito; é este que está no escuro, incapaz de fazer um julgamento lúcido da situação. De novo, estamos às voltas com as ideias de claridade e escuridão, ligadas naturalmente ao dia e à noite.

O adjetivo “cego”, no sentido metafórico, costuma descrever aquilo que não tem medida, que foge ao controle da razão (paixão cega, entusiasmo cego, ódio cego, submissão cega), não sendo nem bom nem mau em si. Um entusiasmo cego pode ser a atitude de quem acredita de fato no que faz, um ódio cego pode ser sede de vingança. Enfim, o termo pode ser empregado para enfatizar uma ideia. Foi assim, aliás, que o usou Milton Nascimento na canção “Fé Cega, Faca Amolada”, em que a fé é inabalável. Vale notar que a lâmina sem corte, ao contrário da “amolada”, também é chamada de “cega” – daí o jogo de palavras usado na letra da canção.

Um nó difícil de desatar é logo chamado de “nó cego” – talvez fruto da ideia de ser muitíssimo apertado, uma variação da noção de ênfase associada ao termo. O bonito da língua é essa maleabilidade, esse leque de associações que se constroem solidariamente entre os falantes sem que se possa saber ao certo quem inventou o quê. Quer mais? Com o acréscimo de um hífen, “nó-cego” passa a ser mais um dos muitos nomes da aguardente de cana.

A expressão “às cegas”, que quer dizer “às escuras” ou “tateando no escuro, sem ver”, é frequentemente usada pelos “sommeliers” em suas conhecidas “degustações às cegas”, ocasiões em que experimentam os vinhos sem ver os rótulos. Dessa forma, libertam-se das informações prévias que poderiam influenciar seu julgamento sobre a bebida, entregando-se voluntariamente à escuridão que faz aflorar o olfato e o paladar.

(...)

Em suma, a tarefa a que se entregam os purificadores da língua parece ser uma infinita corrida de obstáculos. Se, no entanto, for mesmo esse o caminho a seguir para tornar o mundo um lugar mais saudável, talvez possamos criar uma linguagem verdadeiramente neutra, construída com números e letras aleatórias, como as placas de automóvel, coisa que alguma sofisticada inteligência artificial poderia vir a elaborar.

Aos saudosistas restarão o Museu da Língua Portuguesa, que, aliás, já existe, e as bibliotecas que não tiverem perdido de vez o sentido. Hoje luta-se contra as palavras. Bons tempos aqueles em que o poeta lutava com as palavras.

(NICOLETI, Thaís. A Luta contra as palavras. Folha de S. Paulo, 2023. Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/blogs/thaisnicoleti/2023/01/a-luta-contra-as-palavras.shtml. Acesso em: 15/01/2023.)

Considerando as ideias veiculas no texto, o único termo que não seria considerado racista, segundo seu significado e/ou sua origem histórica é

 

Provas

Questão presente nas seguintes provas
3194987 Ano: 2023
Disciplina: Português
Banca: Consulplan
Orgão: Câm. Santos Dumont-MG
Provas:

A luta contra as palavras

De uns tempos para cá, nossa sensibilidade linguística parece ter-se exacerbado. Antes, havia palavras proferidas com o intuito de ofender, os chamados palavrões. Bons tempos! As coisas eram mais claras, pois todos sabíamos quais eram os termos, de fato, insultuosos. Hoje, a qualquer momento, podemos ser pilhados em flagrante delito linguístico ao usar corriqueiramente alguma palavra cujo teor preconceituoso, recém-desvelado por algum perscrutador de ignomínias, nos tenha escapado.

O Tribunal Superior Eleitoral, por exemplo, deu-nos a conhecer uma lista de termos e expressões considerados racistas pela Comissão de Igualdade Racial, entre os quais aparece o verbo “esclarecer”. Segundo os autores do texto, o racismo estaria embutido no termo por ele sugerir que “a compreensão de algo só pode ocorrer sob as bênçãos da claridade, da branquitude, mantendo no campo da dúvida e do desconhecimento as coisas negras”.

Se assim for, expressões como “deixar claro” ou “é claro que”, de largo uso, padecem do mesmo vício de origem. A sugestão dos signatários do documento é “o uso das palavras ‘explicar’ ou ‘elucidar’, por exemplo” em substituição a “esclarecer”. “Explicar”, na origem, é desdobrar, já que vem do latim “plico, as, are”, ou seja, “dobrar”, mas “elucidar” tem “lux” (“luz”) na raiz. Ora, se é racista a singela ideia de que a luz (ou a claridade) nos ajuda a enxergar melhor, o mesmo teria de valer para “elucidar”. Por algum motivo obscuro, porém, “elucidar” passou incólume pelo crivo da comissão.

Talvez, no entanto, a própria ideia de “enxergar” já contenha em si algum viés capacitista. Afinal, há pessoas que enxergam e pessoas que, embora não enxerguem, captam o universo à sua volta com riqueza de detalhes. Há quem diga que os deficientes visuais desenvolvam muito mais os outros sentidos, o que os faz perceber com grande acuidade coisas que independem da claridade, como sons, odores, temperaturas etc.

Segundo o dicionário Houaiss eletrônico, que constantemente recebe atualizações, o termo “cego”, quando usado no sentido de “deficiente visual”, pode ser ofensivo. Notemos que os lexicógrafos foram hesitantes, preferindo não tachar o termo, de uma vez por todas, de depreciativo. “Cego”, do latim “caecus, a, um”, quer dizer “escuro, negro, obscuro, espesso”. Para além do sentido estrito, já no latim o termo era usado no sentido figurado. Da expressão “caecus cupiditate”, herdamos o usual “cego pela paixão”. É dessa mesma raiz que vem o termo “obcecado”, isto é, “cegado” – a palavra está associada ao espírito; é este que está no escuro, incapaz de fazer um julgamento lúcido da situação. De novo, estamos às voltas com as ideias de claridade e escuridão, ligadas naturalmente ao dia e à noite.

O adjetivo “cego”, no sentido metafórico, costuma descrever aquilo que não tem medida, que foge ao controle da razão (paixão cega, entusiasmo cego, ódio cego, submissão cega), não sendo nem bom nem mau em si. Um entusiasmo cego pode ser a atitude de quem acredita de fato no que faz, um ódio cego pode ser sede de vingança. Enfim, o termo pode ser empregado para enfatizar uma ideia. Foi assim, aliás, que o usou Milton Nascimento na canção “Fé Cega, Faca Amolada”, em que a fé é inabalável. Vale notar que a lâmina sem corte, ao contrário da “amolada”, também é chamada de “cega” – daí o jogo de palavras usado na letra da canção.

Um nó difícil de desatar é logo chamado de “nó cego” – talvez fruto da ideia de ser muitíssimo apertado, uma variação da noção de ênfase associada ao termo. O bonito da língua é essa maleabilidade, esse leque de associações que se constroem solidariamente entre os falantes sem que se possa saber ao certo quem inventou o quê. Quer mais? Com o acréscimo de um hífen, “nó-cego” passa a ser mais um dos muitos nomes da aguardente de cana.

A expressão “às cegas”, que quer dizer “às escuras” ou “tateando no escuro, sem ver”, é frequentemente usada pelos “sommeliers” em suas conhecidas “degustações às cegas”, ocasiões em que experimentam os vinhos sem ver os rótulos. Dessa forma, libertam-se das informações prévias que poderiam influenciar seu julgamento sobre a bebida, entregando-se voluntariamente à escuridão que faz aflorar o olfato e o paladar.

(...)

Em suma, a tarefa a que se entregam os purificadores da língua parece ser uma infinita corrida de obstáculos. Se, no entanto, for mesmo esse o caminho a seguir para tornar o mundo um lugar mais saudável, talvez possamos criar uma linguagem verdadeiramente neutra, construída com números e letras aleatórias, como as placas de automóvel, coisa que alguma sofisticada inteligência artificial poderia vir a elaborar.

Aos saudosistas restarão o Museu da Língua Portuguesa, que, aliás, já existe, e as bibliotecas que não tiverem perdido de vez o sentido. Hoje luta-se contra as palavras. Bons tempos aqueles em que o poeta lutava com as palavras.

(NICOLETI, Thaís. A Luta contra as palavras. Folha de S. Paulo, 2023. Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/blogs/thaisnicoleti/2023/01/a-luta-contra-as-palavras.shtml. Acesso em: 15/01/2023.)

Só NÃO é possível subentender da leitura do 9º parágrafo do texto que

 

Provas

Questão presente nas seguintes provas
3194986 Ano: 2023
Disciplina: Português
Banca: Consulplan
Orgão: Câm. Santos Dumont-MG
Provas:

A luta contra as palavras

De uns tempos para cá, nossa sensibilidade linguística parece ter-se exacerbado. Antes, havia palavras proferidas com o intuito de ofender, os chamados palavrões. Bons tempos! As coisas eram mais claras, pois todos sabíamos quais eram os termos, de fato, insultuosos. Hoje, a qualquer momento, podemos ser pilhados em flagrante delito linguístico ao usar corriqueiramente alguma palavra cujo teor preconceituoso, recém-desvelado por algum perscrutador de ignomínias, nos tenha escapado.

O Tribunal Superior Eleitoral, por exemplo, deu-nos a conhecer uma lista de termos e expressões considerados racistas pela Comissão de Igualdade Racial, entre os quais aparece o verbo “esclarecer”. Segundo os autores do texto, o racismo estaria embutido no termo por ele sugerir que “a compreensão de algo só pode ocorrer sob as bênçãos da claridade, da branquitude, mantendo no campo da dúvida e do desconhecimento as coisas negras”.

Se assim for, expressões como “deixar claro” ou “é claro que”, de largo uso, padecem do mesmo vício de origem. A sugestão dos signatários do documento é “o uso das palavras ‘explicar’ ou ‘elucidar’, por exemplo” em substituição a “esclarecer”. “Explicar”, na origem, é desdobrar, já que vem do latim “plico, as, are”, ou seja, “dobrar”, mas “elucidar” tem “lux” (“luz”) na raiz. Ora, se é racista a singela ideia de que a luz (ou a claridade) nos ajuda a enxergar melhor, o mesmo teria de valer para “elucidar”. Por algum motivo obscuro, porém, “elucidar” passou incólume pelo crivo da comissão.

Talvez, no entanto, a própria ideia de “enxergar” já contenha em si algum viés capacitista. Afinal, há pessoas que enxergam e pessoas que, embora não enxerguem, captam o universo à sua volta com riqueza de detalhes. Há quem diga que os deficientes visuais desenvolvam muito mais os outros sentidos, o que os faz perceber com grande acuidade coisas que independem da claridade, como sons, odores, temperaturas etc.

Segundo o dicionário Houaiss eletrônico, que constantemente recebe atualizações, o termo “cego”, quando usado no sentido de “deficiente visual”, pode ser ofensivo. Notemos que os lexicógrafos foram hesitantes, preferindo não tachar o termo, de uma vez por todas, de depreciativo. “Cego”, do latim “caecus, a, um”, quer dizer “escuro, negro, obscuro, espesso”. Para além do sentido estrito, já no latim o termo era usado no sentido figurado. Da expressão “caecus cupiditate”, herdamos o usual “cego pela paixão”. É dessa mesma raiz que vem o termo “obcecado”, isto é, “cegado” – a palavra está associada ao espírito; é este que está no escuro, incapaz de fazer um julgamento lúcido da situação. De novo, estamos às voltas com as ideias de claridade e escuridão, ligadas naturalmente ao dia e à noite.

O adjetivo “cego”, no sentido metafórico, costuma descrever aquilo que não tem medida, que foge ao controle da razão (paixão cega, entusiasmo cego, ódio cego, submissão cega), não sendo nem bom nem mau em si. Um entusiasmo cego pode ser a atitude de quem acredita de fato no que faz, um ódio cego pode ser sede de vingança. Enfim, o termo pode ser empregado para enfatizar uma ideia. Foi assim, aliás, que o usou Milton Nascimento na canção “Fé Cega, Faca Amolada”, em que a fé é inabalável. Vale notar que a lâmina sem corte, ao contrário da “amolada”, também é chamada de “cega” – daí o jogo de palavras usado na letra da canção.

Um nó difícil de desatar é logo chamado de “nó cego” – talvez fruto da ideia de ser muitíssimo apertado, uma variação da noção de ênfase associada ao termo. O bonito da língua é essa maleabilidade, esse leque de associações que se constroem solidariamente entre os falantes sem que se possa saber ao certo quem inventou o quê. Quer mais? Com o acréscimo de um hífen, “nó-cego” passa a ser mais um dos muitos nomes da aguardente de cana.

A expressão “às cegas”, que quer dizer “às escuras” ou “tateando no escuro, sem ver”, é frequentemente usada pelos “sommeliers” em suas conhecidas “degustações às cegas”, ocasiões em que experimentam os vinhos sem ver os rótulos. Dessa forma, libertam-se das informações prévias que poderiam influenciar seu julgamento sobre a bebida, entregando-se voluntariamente à escuridão que faz aflorar o olfato e o paladar.

(...)

Em suma, a tarefa a que se entregam os purificadores da língua parece ser uma infinita corrida de obstáculos. Se, no entanto, for mesmo esse o caminho a seguir para tornar o mundo um lugar mais saudável, talvez possamos criar uma linguagem verdadeiramente neutra, construída com números e letras aleatórias, como as placas de automóvel, coisa que alguma sofisticada inteligência artificial poderia vir a elaborar.

Aos saudosistas restarão o Museu da Língua Portuguesa, que, aliás, já existe, e as bibliotecas que não tiverem perdido de vez o sentido. Hoje luta-se contra as palavras. Bons tempos aqueles em que o poeta lutava com as palavras.

(NICOLETI, Thaís. A Luta contra as palavras. Folha de S. Paulo, 2023. Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/blogs/thaisnicoleti/2023/01/a-luta-contra-as-palavras.shtml. Acesso em: 15/01/2023.)

De acordo com o texto, os lexicógrafos NÃO classificaram definitivamente o termo “cego” como depreciativo porque

 

Provas

Questão presente nas seguintes provas
3194985 Ano: 2023
Disciplina: Português
Banca: Consulplan
Orgão: Câm. Santos Dumont-MG
Provas:

A luta contra as palavras

De uns tempos para cá, nossa sensibilidade linguística parece ter-se exacerbado. Antes, havia palavras proferidas com o intuito de ofender, os chamados palavrões. Bons tempos! As coisas eram mais claras, pois todos sabíamos quais eram os termos, de fato, insultuosos. Hoje, a qualquer momento, podemos ser pilhados em flagrante delito linguístico ao usar corriqueiramente alguma palavra cujo teor preconceituoso, recém-desvelado por algum perscrutador de ignomínias, nos tenha escapado.

O Tribunal Superior Eleitoral, por exemplo, deu-nos a conhecer uma lista de termos e expressões considerados racistas pela Comissão de Igualdade Racial, entre os quais aparece o verbo “esclarecer”. Segundo os autores do texto, o racismo estaria embutido no termo por ele sugerir que “a compreensão de algo só pode ocorrer sob as bênçãos da claridade, da branquitude, mantendo no campo da dúvida e do desconhecimento as coisas negras”.

Se assim for, expressões como “deixar claro” ou “é claro que”, de largo uso, padecem do mesmo vício de origem. A sugestão dos signatários do documento é “o uso das palavras ‘explicar’ ou ‘elucidar’, por exemplo” em substituição a “esclarecer”. “Explicar”, na origem, é desdobrar, já que vem do latim “plico, as, are”, ou seja, “dobrar”, mas “elucidar” tem “lux” (“luz”) na raiz. Ora, se é racista a singela ideia de que a luz (ou a claridade) nos ajuda a enxergar melhor, o mesmo teria de valer para “elucidar”. Por algum motivo obscuro, porém, “elucidar” passou incólume pelo crivo da comissão.

Talvez, no entanto, a própria ideia de “enxergar” já contenha em si algum viés capacitista. Afinal, há pessoas que enxergam e pessoas que, embora não enxerguem, captam o universo à sua volta com riqueza de detalhes. Há quem diga que os deficientes visuais desenvolvam muito mais os outros sentidos, o que os faz perceber com grande acuidade coisas que independem da claridade, como sons, odores, temperaturas etc.

Segundo o dicionário Houaiss eletrônico, que constantemente recebe atualizações, o termo “cego”, quando usado no sentido de “deficiente visual”, pode ser ofensivo. Notemos que os lexicógrafos foram hesitantes, preferindo não tachar o termo, de uma vez por todas, de depreciativo. “Cego”, do latim “caecus, a, um”, quer dizer “escuro, negro, obscuro, espesso”. Para além do sentido estrito, já no latim o termo era usado no sentido figurado. Da expressão “caecus cupiditate”, herdamos o usual “cego pela paixão”. É dessa mesma raiz que vem o termo “obcecado”, isto é, “cegado” – a palavra está associada ao espírito; é este que está no escuro, incapaz de fazer um julgamento lúcido da situação. De novo, estamos às voltas com as ideias de claridade e escuridão, ligadas naturalmente ao dia e à noite.

O adjetivo “cego”, no sentido metafórico, costuma descrever aquilo que não tem medida, que foge ao controle da razão (paixão cega, entusiasmo cego, ódio cego, submissão cega), não sendo nem bom nem mau em si. Um entusiasmo cego pode ser a atitude de quem acredita de fato no que faz, um ódio cego pode ser sede de vingança. Enfim, o termo pode ser empregado para enfatizar uma ideia. Foi assim, aliás, que o usou Milton Nascimento na canção “Fé Cega, Faca Amolada”, em que a fé é inabalável. Vale notar que a lâmina sem corte, ao contrário da “amolada”, também é chamada de “cega” – daí o jogo de palavras usado na letra da canção.

Um nó difícil de desatar é logo chamado de “nó cego” – talvez fruto da ideia de ser muitíssimo apertado, uma variação da noção de ênfase associada ao termo. O bonito da língua é essa maleabilidade, esse leque de associações que se constroem solidariamente entre os falantes sem que se possa saber ao certo quem inventou o quê. Quer mais? Com o acréscimo de um hífen, “nó-cego” passa a ser mais um dos muitos nomes da aguardente de cana.

A expressão “às cegas”, que quer dizer “às escuras” ou “tateando no escuro, sem ver”, é frequentemente usada pelos “sommeliers” em suas conhecidas “degustações às cegas”, ocasiões em que experimentam os vinhos sem ver os rótulos. Dessa forma, libertam-se das informações prévias que poderiam influenciar seu julgamento sobre a bebida, entregando-se voluntariamente à escuridão que faz aflorar o olfato e o paladar.

(...)

Em suma, a tarefa a que se entregam os purificadores da língua parece ser uma infinita corrida de obstáculos. Se, no entanto, for mesmo esse o caminho a seguir para tornar o mundo um lugar mais saudável, talvez possamos criar uma linguagem verdadeiramente neutra, construída com números e letras aleatórias, como as placas de automóvel, coisa que alguma sofisticada inteligência artificial poderia vir a elaborar.

Aos saudosistas restarão o Museu da Língua Portuguesa, que, aliás, já existe, e as bibliotecas que não tiverem perdido de vez o sentido. Hoje luta-se contra as palavras. Bons tempos aqueles em que o poeta lutava com as palavras.

(NICOLETI, Thaís. A Luta contra as palavras. Folha de S. Paulo, 2023. Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/blogs/thaisnicoleti/2023/01/a-luta-contra-as-palavras.shtml. Acesso em: 15/01/2023.)

Com relação à tipologia predominante e às informações veiculadas, pode-se afirmar que se trata de um texto

 

Provas

Questão presente nas seguintes provas
3195080 Ano: 2023
Disciplina: Direito Administrativo
Banca: Consulplan
Orgão: Câm. Santos Dumont-MG
Provas:

Licitação é o procedimento administrativo formal que se estabelece de forma prévia às contratações de serviços, aquisições de produtos, ou até mesmo para registrar preços para contratações futuras pelos entes da administração pública direta ou indireta, que também pode ser considerada como pré-contrato, que tem como objetivo principal a obtenção das propostas mais vantajosas e justas. Conforme dispõe a Lei nº 8.666/1993, poderá participar, direta ou indiretamente, da licitação ou da execução de obra ou serviço e do fornecimento de bens:

Questão Desatualizada

Provas

Questão presente nas seguintes provas